quarta-feira, 29 de abril de 2020

luto

a gente ta vivendo um grande processo de luto(s)... pequenos e grandes, internos e internos, individuais e coletivos. Lutos de relações, de processos, de expectativas, de vidas, de projetos e de mundo.
cada conversa mais sincera que tenho com um amigo/amiga que seja mais íntimo de mim eu posso tanto compartilhas quanto testemunhar isso. Luto pela maneira que a gente vivia as emoções e as dores, enquanto o mundo concretamente perde tantas vidas, luto pelas escolhas que fizemos e que trouxeram cada um e todos nós até aqui, nesse momento que está tão difícil pra todo mundo, mas que cruelmente insiste em ser mais difícil pra uns que pra outros (os mesmos desfavorecidos e prejudicados de sempre pela historia).
cada vida carrega em si um universo de historia e possibilidades e dentro de cada coração que tem a chance ou que se permite a oportunidade de se distrair da anestesia, nessa quarentena, o luto invade. sorrateiro ou repentino, discreto ou avassalador, ele chega. paro pra reparar as vidas que me rodeiam e percebo que o pequeno mundo do qual elas fazem parte está em transformação, inevitavelmente.
estamos mais sensíveis, triste, maníacos, falantes, introspectivos, dorminhocos, insones... diante do isolamento enfrentamos espelhos em todos os cômodos da casa e enxergamos imagens sem filtros, resgatamos arquivos antigos, fazemos faxina pra lidar com o lixo que nós mesmos temos produzido, dentro e fora.
a gente ta vivendo um grande processo de luto... na minha vida, to em luto pela juventude que ta com cara de fim, pelo projeto de casamento que estaria se concretizando nessa semana e foi adiado, pelas ultimas semanas todas (incluido aniversarios meu, da minha irma, do meu melhor amigo) sem poder abraçar, beijar e trocar toque com as pessoas que eu amo, luto pelo país que eu sempre critiquei e sofri tanto, mas que parece desmoronar, e ninguém faz ideia do que vai vir... luto pelo trabalho que continuo prestando ao municipio onde vivo (nao estou mais em casa todos os dias) mas que diariamente se confirma contraditorio e insuficiente, bem diferente do "essencial" estampado nos decretos e diários oficiais. Tudo que vinha sendo é cheio de problemas, sujeira, fedor, mau-jeito, contradição... e precisava morrer. Tudo que vinha sendo construído está em transformação. Ninguém, absolutamente nenhum de nós tem algum controle sobre essa surrealidade que a gente ta vivendo. Estamos lidando com crise existencial, mundial, de saúde, politica, economica, tudo ao mesmo tempo e a gente nao sabe como vai ficar depois que isso passar. Tudo morre. Os ciclos encerram, as relações, quando se transformam, também morrem para nascer de outra maneira. Nós, nossos familiares, amigos, colegas de trabalho estamos expostos a um vírus biologico, tantos vírus politicos e inumeros fantasmas que ameaçam a gente de adoecer todo dia, do corpo, de forme, de desgosto. E a gente ta vivendo um grande luto.. eu olho pra dentro de mim e me dou conta que dentro do que me construi até hoje... nao tinha como nao ser assim.
Me deparo com solidao, tédio, choro fácil, sonhos férteis, frases que saltam da boca antes que eu possa filtrar, frutração, e luto. Luto de incerteza, de transformação, decantação no tempo... lento... em movimento, mesmo que parecendo parado. Luto.. luto de choro, de melancolia, luto de mudança. Luto de coração e espero que, coletivamente também, luto de verbo.


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