sexta-feira, 20 de março de 2020

Casamento em tempos de COVID-19

Eu sempre ouvi dizer que alguma coisa foge do controle, sai do planejamento. Casamento sempre vai ter aquela história de imprevistos... Eu tava acalmando meu coração e ficando em paz com isso. Podia ser a chuva, alguém que engravida e não pode ir à festa, gente que falta, que adoece, gente que vai à mais hahahaha, muitas coisas que fogem do roteiro... Uma pandemia que paralisa as pessoas, fecha as lojas, instaura medo e preocupação em todo mundo e de repente obriga a gente a interromper o planejamento de quatro anos pra ficar em casa?! Com essa eu não contava. É imprevisto raiz.
Já passou de um tudo aqui na minha cabeça... por que a gente?! é a primeira coisa que vem em mente né. Eu to tentando acolher os sofrimentos da menina que se empolgou com o casamento que estava prestes a acontecer e que agora precisa ser adiado. To tentando chorar o fato de que não vamos casar quando estivermos fazendo aniversário de namoro. Que nossa numerologia vai dar 3 e não 11, que saímos de um mês de pouca chuva pra um mês que... enfim... seja o que Deus quiser! Quando esse choro passa, eu tento lembrar que o importante pra gente vai acontecer. Nós vamos casar. Talvez esse tenha sido o jeito que a vida deu, pra que seja mais do nosso jeito... Vai saber?!
Vamos passar por essa fase, tomando conta da gente, acolhendo (à distância) os nossos, lavando as mãos, dobrando os joelhos, mantendo a mente arejada. Vai ficar tudo bem. Não vamos inverter nossas prioridades agora!
Enquanto casal a gente sempre se identificou com as construções de comunidade, com a força do coletivo. Nesse momento, o coletivo pede atenção, o SUS pede atenção, as vidas de todos pedem atenção. Olhando o significado e a força desse momento, a adulta que está frustrada com as papelarias já impressas na data de 02 de maio consegue olhar nos olhos da menina emburrada e sorrir com alguma tranquilidade, ainda que contraditória... por que não a gente?!

Casamento é ritual coletivo. Pra família que esse casório ta selando, vida boa é a que se vive junto. Pra isso ser possível, precisa rearranjar então. Vamos lá... habitar nossos valores, olhar pro coletivo, repensar nossos hábitos, o consumismo, nossa relação destrutiva com a natureza. Reavaliar prioridades. Como vai ser, no final do ano, poder abraçar e beijar quem a gente ama depois de ter passado um tempo em quarentena, em isolamento? Ainda vamos priorizar tanto assim nossos telefones? Os stories? Quem sabe depois de tanta ausência, a gente possa finalmente estar mais presente... 'Ai se sesse...!'
São muitas incertezas. Todo o excel de planejamento é colocado em xeque nesse momento. Precisamos parar. Ficar em casa. Lavar as mãos. Irônico... A vida tem suas maneiras de escancarar pra gente o que a gente, enquanto humanidade, ta fazendo errado. Daqui algum tempo vamos estar fortalecidas por ter atravessado esse período com cara de fim do mundo, e, se tudo der certo, estaremos bem. Quem sabe?! Não adianta tentar adivinhar... Que esse período seja inventivo, de alguma forma. Que a gente aprenda a usar as redes sociais pra nos apoiarmos e nos fortalecermos em vez de nos anestesiarmos apenas. Que quando os encontros presenciais finalmente voltarem a acontecer, a gente possa valorizá-los mais. Presentear os nossos com nossa presença inteira, completa, cheia de incoerências, cheiros, afetos...
Eu não sei se vai ficar tudo bem... Sinceramente, eu acho que não. O mundo ainda tá complicado, nossa gente ainda ta desamparada, ainda tem muito egoísmo e mesquinhez no dia-a-dia. Mas também aposto no descanso de valorizar o que a gente tem. Ainda existe rede, apoio, solidariedade, amor, música, relação. Espero que quando essa cacetada que a vida ta dando passar, a gente esteja mais forte, mais disponível, mais atento e com mais coragem de estar. No fim do dia eu e a Thais não temos nada de especial pra que tivéssemos sido 'poupadas' desse transtorno nesse momento. Já esse transtorno, NESSE MOMENTO, olha... certamente ele tem muito ainda o que nos ensinar e fortalecer. Então... de algum jeito torto, estranho, que eu até duvido quando escuto, a menina emburrada e a mulher frustrada dentro de mim se olham e também sentem algo como: 'que bom que foi com a gente'... Vai entender...
É tudo bagunçado assim mesmo... E ainda é o 1º dia oficial da minha 'quarentena' de sei lá quantos dias.