raiva
cansaço
esgotamento
tristeza
insegurança
ansiedade
desilusão
medo
tensão
sufoco
rancor
frustração
trajetos
We believe we can touch the sky ઇઉ
segunda-feira, 29 de junho de 2020
terça-feira, 5 de maio de 2020
paguem seus funcionários
moro numa sobreloja. alugo uma casa que fica em cima de um comercio grande aqui da minha cidade. esse comercio movimenta um fluxo bem alto de clientes, encomendas, tem uma entrada e saída de caminhões com entregas que me surpreendeu quando cheguei aqui.
pra acessar minha casa, passo pela entrada desse comercio e subo uma escada que é limpa pela funcionária deles, uma senhora.
durante as primeiras semanas do isolamento, esse comercio ficou fechado e agora eles reabriram as portas. essa senhora hoje apareceu aqui na escada que fica de frente pra minha casa pra limpar. numa conversa trivial da Thais com ela soubemos que ela não recebeu pagamento durante o tempo de quarentena pela pandemia. meu coração cortou.
não é um comércio pequeno, é certamente o principal da nossa cidade no ramo, o impacto da falta desse salário no orçamento da funcionaria da limpeza certamente é bem maior do que o impacto de pagar por ele para esse comércio. Provavelmente o aluguel da nossa casa já pagaria esse salário... e outros aluguéis de um prédio aqui da rua do qual os donos desse comercio também são proprietários...
volto de um dia de trabalho em que atendi centenas de pessoas com problemas no pagamento do auxílio emergencial do governo, olho pra minha casa e penso que o dinheiro do meu aluguel está sendo pago para proprietários de comercios e de imóves que friamente se recusaram a manter uma (pelo menos uma) de suas funcionárias em segurança em casa durante a pandemia.
é cada dia mais triste, desesperador atravessar essa vida sem ter o peito dilacerado por esse vírus vergonhoso da desigualdade social.
pra acessar minha casa, passo pela entrada desse comercio e subo uma escada que é limpa pela funcionária deles, uma senhora.
durante as primeiras semanas do isolamento, esse comercio ficou fechado e agora eles reabriram as portas. essa senhora hoje apareceu aqui na escada que fica de frente pra minha casa pra limpar. numa conversa trivial da Thais com ela soubemos que ela não recebeu pagamento durante o tempo de quarentena pela pandemia. meu coração cortou.
não é um comércio pequeno, é certamente o principal da nossa cidade no ramo, o impacto da falta desse salário no orçamento da funcionaria da limpeza certamente é bem maior do que o impacto de pagar por ele para esse comércio. Provavelmente o aluguel da nossa casa já pagaria esse salário... e outros aluguéis de um prédio aqui da rua do qual os donos desse comercio também são proprietários...
volto de um dia de trabalho em que atendi centenas de pessoas com problemas no pagamento do auxílio emergencial do governo, olho pra minha casa e penso que o dinheiro do meu aluguel está sendo pago para proprietários de comercios e de imóves que friamente se recusaram a manter uma (pelo menos uma) de suas funcionárias em segurança em casa durante a pandemia.
é cada dia mais triste, desesperador atravessar essa vida sem ter o peito dilacerado por esse vírus vergonhoso da desigualdade social.
quarta-feira, 29 de abril de 2020
luto
a gente ta vivendo um grande processo de luto(s)... pequenos e grandes, internos e internos, individuais e coletivos. Lutos de relações, de processos, de expectativas, de vidas, de projetos e de mundo.
cada conversa mais sincera que tenho com um amigo/amiga que seja mais íntimo de mim eu posso tanto compartilhas quanto testemunhar isso. Luto pela maneira que a gente vivia as emoções e as dores, enquanto o mundo concretamente perde tantas vidas, luto pelas escolhas que fizemos e que trouxeram cada um e todos nós até aqui, nesse momento que está tão difícil pra todo mundo, mas que cruelmente insiste em ser mais difícil pra uns que pra outros (os mesmos desfavorecidos e prejudicados de sempre pela historia).
cada vida carrega em si um universo de historia e possibilidades e dentro de cada coração que tem a chance ou que se permite a oportunidade de se distrair da anestesia, nessa quarentena, o luto invade. sorrateiro ou repentino, discreto ou avassalador, ele chega. paro pra reparar as vidas que me rodeiam e percebo que o pequeno mundo do qual elas fazem parte está em transformação, inevitavelmente.
estamos mais sensíveis, triste, maníacos, falantes, introspectivos, dorminhocos, insones... diante do isolamento enfrentamos espelhos em todos os cômodos da casa e enxergamos imagens sem filtros, resgatamos arquivos antigos, fazemos faxina pra lidar com o lixo que nós mesmos temos produzido, dentro e fora.
a gente ta vivendo um grande processo de luto... na minha vida, to em luto pela juventude que ta com cara de fim, pelo projeto de casamento que estaria se concretizando nessa semana e foi adiado, pelas ultimas semanas todas (incluido aniversarios meu, da minha irma, do meu melhor amigo) sem poder abraçar, beijar e trocar toque com as pessoas que eu amo, luto pelo país que eu sempre critiquei e sofri tanto, mas que parece desmoronar, e ninguém faz ideia do que vai vir... luto pelo trabalho que continuo prestando ao municipio onde vivo (nao estou mais em casa todos os dias) mas que diariamente se confirma contraditorio e insuficiente, bem diferente do "essencial" estampado nos decretos e diários oficiais. Tudo que vinha sendo é cheio de problemas, sujeira, fedor, mau-jeito, contradição... e precisava morrer. Tudo que vinha sendo construído está em transformação. Ninguém, absolutamente nenhum de nós tem algum controle sobre essa surrealidade que a gente ta vivendo. Estamos lidando com crise existencial, mundial, de saúde, politica, economica, tudo ao mesmo tempo e a gente nao sabe como vai ficar depois que isso passar. Tudo morre. Os ciclos encerram, as relações, quando se transformam, também morrem para nascer de outra maneira. Nós, nossos familiares, amigos, colegas de trabalho estamos expostos a um vírus biologico, tantos vírus politicos e inumeros fantasmas que ameaçam a gente de adoecer todo dia, do corpo, de forme, de desgosto. E a gente ta vivendo um grande luto.. eu olho pra dentro de mim e me dou conta que dentro do que me construi até hoje... nao tinha como nao ser assim.
Me deparo com solidao, tédio, choro fácil, sonhos férteis, frases que saltam da boca antes que eu possa filtrar, frutração, e luto. Luto de incerteza, de transformação, decantação no tempo... lento... em movimento, mesmo que parecendo parado. Luto.. luto de choro, de melancolia, luto de mudança. Luto de coração e espero que, coletivamente também, luto de verbo.
cada conversa mais sincera que tenho com um amigo/amiga que seja mais íntimo de mim eu posso tanto compartilhas quanto testemunhar isso. Luto pela maneira que a gente vivia as emoções e as dores, enquanto o mundo concretamente perde tantas vidas, luto pelas escolhas que fizemos e que trouxeram cada um e todos nós até aqui, nesse momento que está tão difícil pra todo mundo, mas que cruelmente insiste em ser mais difícil pra uns que pra outros (os mesmos desfavorecidos e prejudicados de sempre pela historia).
cada vida carrega em si um universo de historia e possibilidades e dentro de cada coração que tem a chance ou que se permite a oportunidade de se distrair da anestesia, nessa quarentena, o luto invade. sorrateiro ou repentino, discreto ou avassalador, ele chega. paro pra reparar as vidas que me rodeiam e percebo que o pequeno mundo do qual elas fazem parte está em transformação, inevitavelmente.
estamos mais sensíveis, triste, maníacos, falantes, introspectivos, dorminhocos, insones... diante do isolamento enfrentamos espelhos em todos os cômodos da casa e enxergamos imagens sem filtros, resgatamos arquivos antigos, fazemos faxina pra lidar com o lixo que nós mesmos temos produzido, dentro e fora.
a gente ta vivendo um grande processo de luto... na minha vida, to em luto pela juventude que ta com cara de fim, pelo projeto de casamento que estaria se concretizando nessa semana e foi adiado, pelas ultimas semanas todas (incluido aniversarios meu, da minha irma, do meu melhor amigo) sem poder abraçar, beijar e trocar toque com as pessoas que eu amo, luto pelo país que eu sempre critiquei e sofri tanto, mas que parece desmoronar, e ninguém faz ideia do que vai vir... luto pelo trabalho que continuo prestando ao municipio onde vivo (nao estou mais em casa todos os dias) mas que diariamente se confirma contraditorio e insuficiente, bem diferente do "essencial" estampado nos decretos e diários oficiais. Tudo que vinha sendo é cheio de problemas, sujeira, fedor, mau-jeito, contradição... e precisava morrer. Tudo que vinha sendo construído está em transformação. Ninguém, absolutamente nenhum de nós tem algum controle sobre essa surrealidade que a gente ta vivendo. Estamos lidando com crise existencial, mundial, de saúde, politica, economica, tudo ao mesmo tempo e a gente nao sabe como vai ficar depois que isso passar. Tudo morre. Os ciclos encerram, as relações, quando se transformam, também morrem para nascer de outra maneira. Nós, nossos familiares, amigos, colegas de trabalho estamos expostos a um vírus biologico, tantos vírus politicos e inumeros fantasmas que ameaçam a gente de adoecer todo dia, do corpo, de forme, de desgosto. E a gente ta vivendo um grande luto.. eu olho pra dentro de mim e me dou conta que dentro do que me construi até hoje... nao tinha como nao ser assim.
Me deparo com solidao, tédio, choro fácil, sonhos férteis, frases que saltam da boca antes que eu possa filtrar, frutração, e luto. Luto de incerteza, de transformação, decantação no tempo... lento... em movimento, mesmo que parecendo parado. Luto.. luto de choro, de melancolia, luto de mudança. Luto de coração e espero que, coletivamente também, luto de verbo.
quarta-feira, 8 de abril de 2020
diário de quarentena - dia 20
Estamos no meio de uma pandemia. Um vírus do qual todo o mundo, a essa altura já ouviu falar, uma doença que recolhe 1/3 da população mundial dentro de casa, que amedronta os que não têm onde se abrigar, que seleciona os que não têm renda para se exporem à crueldade do risco de morrer de fome ou de doença.
São algumas semanas em isolamento social, tendo contato físico apenas com a minha noiva, conversando com as outras pessoas apenas pelas redes sociais, acompanhando notícias e tentando acompanhar também minhas intuições e meu corpo ao longo desse processo...
Não, eu não tentei estabelecer uma rotina nem de trabalho, nem de exercício físico, nem de cuidados com a casa, nem de atividades de bem-estar nem porra nenhuma. Foram vários os dias em que eu levantei ás 08h ou 09h da manhã porque eu estava descansada. Também têm sido vários os dias em que eu acordo às 12h, 13h, até mesmo 14h e só levanto 15h da cama porque estou melancólica com o cenário todo.
Tenho uma companhia ótima pra esses dias de quarentena. A gente tanto arruma quanto bagunça nossa casa. Nossa louça já esteve toda organizada, limpa e exemplar, como -nesse momento, não pela primeira vez- já esteve pela casa suja registrando nossas inseguranças, tédios e falta de direcionamento.
Tive dias esperançosos. Tudo isso há de ter alguma razão. A gente precisa aprender enquanto humanidade... Hoje eu estou amarga. Melancólica mesmo. A gente não aprende. A gente se destrói. Nossa humanidade é formada por idiotas perversos suicidas.
Minha espiritualidade nunca esteve tão aguçada. Todos os dias eu rezo, não porque estabeleci uma rotina pra isso, mas porque quando me dou conta, já comecei... e tem sido um mergulho muito curativo em mim mesma e muito importante pra me manter em algum tipo de vibração que eu ainda não entendi direito... mas que parece que me mantem em algum eixo... Minha relação com meus guias, em especial meu Preto Velho e meu guardião Exu, estão mais sensíveis do que nunca. Eu percebo o momento de acender uma vela, de deixar o choro chegar, de me recolher em meditação, de pedir pelos meus, de agradecer por mais um dia, os ensinamentos estão mais perceptíveis, os recados estão chegando e as confirmações também vêm mais rápido, o preenchimento do meu peito com amor é imediato, as lágrimas ocupam meus olhos sem que eu consiga controlá-las e, em se tratando de mim, isso é ótimo.
Não achei que minha geração ia viver isso de pandemia, viu... eu não tinha criatividade pra isso não. Lembro de em 2018 eu temer verdadeiramente o retorno dos militares nas ruas perseguindo pessoas como eu e muitas das que eu amo, convivo, admiro, enfim. Uma pandemia?! Semanas em casa? Abraços que a gente não sabe se colocam as pessoas em risco?! Não... quem poderia prever?!
Enfim...
Esse texto todo não tem nenhum sentido mesmo... é mais um despejo de frases e pensamentos, como esse espaço todo que, não por acaso, eu nem divulgo mesmo.
São algumas semanas em isolamento social, tendo contato físico apenas com a minha noiva, conversando com as outras pessoas apenas pelas redes sociais, acompanhando notícias e tentando acompanhar também minhas intuições e meu corpo ao longo desse processo...
Não, eu não tentei estabelecer uma rotina nem de trabalho, nem de exercício físico, nem de cuidados com a casa, nem de atividades de bem-estar nem porra nenhuma. Foram vários os dias em que eu levantei ás 08h ou 09h da manhã porque eu estava descansada. Também têm sido vários os dias em que eu acordo às 12h, 13h, até mesmo 14h e só levanto 15h da cama porque estou melancólica com o cenário todo.
Tenho uma companhia ótima pra esses dias de quarentena. A gente tanto arruma quanto bagunça nossa casa. Nossa louça já esteve toda organizada, limpa e exemplar, como -nesse momento, não pela primeira vez- já esteve pela casa suja registrando nossas inseguranças, tédios e falta de direcionamento.
Tive dias esperançosos. Tudo isso há de ter alguma razão. A gente precisa aprender enquanto humanidade... Hoje eu estou amarga. Melancólica mesmo. A gente não aprende. A gente se destrói. Nossa humanidade é formada por idiotas perversos suicidas.
Minha espiritualidade nunca esteve tão aguçada. Todos os dias eu rezo, não porque estabeleci uma rotina pra isso, mas porque quando me dou conta, já comecei... e tem sido um mergulho muito curativo em mim mesma e muito importante pra me manter em algum tipo de vibração que eu ainda não entendi direito... mas que parece que me mantem em algum eixo... Minha relação com meus guias, em especial meu Preto Velho e meu guardião Exu, estão mais sensíveis do que nunca. Eu percebo o momento de acender uma vela, de deixar o choro chegar, de me recolher em meditação, de pedir pelos meus, de agradecer por mais um dia, os ensinamentos estão mais perceptíveis, os recados estão chegando e as confirmações também vêm mais rápido, o preenchimento do meu peito com amor é imediato, as lágrimas ocupam meus olhos sem que eu consiga controlá-las e, em se tratando de mim, isso é ótimo.
Não achei que minha geração ia viver isso de pandemia, viu... eu não tinha criatividade pra isso não. Lembro de em 2018 eu temer verdadeiramente o retorno dos militares nas ruas perseguindo pessoas como eu e muitas das que eu amo, convivo, admiro, enfim. Uma pandemia?! Semanas em casa? Abraços que a gente não sabe se colocam as pessoas em risco?! Não... quem poderia prever?!
Enfim...
Esse texto todo não tem nenhum sentido mesmo... é mais um despejo de frases e pensamentos, como esse espaço todo que, não por acaso, eu nem divulgo mesmo.
sexta-feira, 20 de março de 2020
Casamento em tempos de COVID-19
Eu sempre ouvi dizer que alguma coisa foge do controle, sai do planejamento. Casamento sempre vai ter aquela história de imprevistos... Eu tava acalmando meu coração e ficando em paz com isso. Podia ser a chuva, alguém que engravida e não pode ir à festa, gente que falta, que adoece, gente que vai à mais hahahaha, muitas coisas que fogem do roteiro... Uma pandemia que paralisa as pessoas, fecha as lojas, instaura medo e preocupação em todo mundo e de repente obriga a gente a interromper o planejamento de quatro anos pra ficar em casa?! Com essa eu não contava. É imprevisto raiz.
Já passou de um tudo aqui na minha cabeça... por que a gente?! é a primeira coisa que vem em mente né. Eu to tentando acolher os sofrimentos da menina que se empolgou com o casamento que estava prestes a acontecer e que agora precisa ser adiado. To tentando chorar o fato de que não vamos casar quando estivermos fazendo aniversário de namoro. Que nossa numerologia vai dar 3 e não 11, que saímos de um mês de pouca chuva pra um mês que... enfim... seja o que Deus quiser! Quando esse choro passa, eu tento lembrar que o importante pra gente vai acontecer. Nós vamos casar. Talvez esse tenha sido o jeito que a vida deu, pra que seja mais do nosso jeito... Vai saber?!
Vamos passar por essa fase, tomando conta da gente, acolhendo (à distância) os nossos, lavando as mãos, dobrando os joelhos, mantendo a mente arejada. Vai ficar tudo bem. Não vamos inverter nossas prioridades agora!
Enquanto casal a gente sempre se identificou com as construções de comunidade, com a força do coletivo. Nesse momento, o coletivo pede atenção, o SUS pede atenção, as vidas de todos pedem atenção. Olhando o significado e a força desse momento, a adulta que está frustrada com as papelarias já impressas na data de 02 de maio consegue olhar nos olhos da menina emburrada e sorrir com alguma tranquilidade, ainda que contraditória... por que não a gente?!
Casamento é ritual coletivo. Pra família que esse casório ta selando, vida boa é a que se vive junto. Pra isso ser possível, precisa rearranjar então. Vamos lá... habitar nossos valores, olhar pro coletivo, repensar nossos hábitos, o consumismo, nossa relação destrutiva com a natureza. Reavaliar prioridades. Como vai ser, no final do ano, poder abraçar e beijar quem a gente ama depois de ter passado um tempo em quarentena, em isolamento? Ainda vamos priorizar tanto assim nossos telefones? Os stories? Quem sabe depois de tanta ausência, a gente possa finalmente estar mais presente... 'Ai se sesse...!'
Casamento é ritual coletivo. Pra família que esse casório ta selando, vida boa é a que se vive junto. Pra isso ser possível, precisa rearranjar então. Vamos lá... habitar nossos valores, olhar pro coletivo, repensar nossos hábitos, o consumismo, nossa relação destrutiva com a natureza. Reavaliar prioridades. Como vai ser, no final do ano, poder abraçar e beijar quem a gente ama depois de ter passado um tempo em quarentena, em isolamento? Ainda vamos priorizar tanto assim nossos telefones? Os stories? Quem sabe depois de tanta ausência, a gente possa finalmente estar mais presente... 'Ai se sesse...!'
São muitas incertezas. Todo o excel de planejamento é colocado em xeque nesse momento. Precisamos parar. Ficar em casa. Lavar as mãos. Irônico... A vida tem suas maneiras de escancarar pra gente o que a gente, enquanto humanidade, ta fazendo errado. Daqui algum tempo vamos estar fortalecidas por ter atravessado esse período com cara de fim do mundo, e, se tudo der certo, estaremos bem. Quem sabe?! Não adianta tentar adivinhar... Que esse período seja inventivo, de alguma forma. Que a gente aprenda a usar as redes sociais pra nos apoiarmos e nos fortalecermos em vez de nos anestesiarmos apenas. Que quando os encontros presenciais finalmente voltarem a acontecer, a gente possa valorizá-los mais. Presentear os nossos com nossa presença inteira, completa, cheia de incoerências, cheiros, afetos...
Eu não sei se vai ficar tudo bem... Sinceramente, eu acho que não. O mundo ainda tá complicado, nossa gente ainda ta desamparada, ainda tem muito egoísmo e mesquinhez no dia-a-dia. Mas também aposto no descanso de valorizar o que a gente tem. Ainda existe rede, apoio, solidariedade, amor, música, relação. Espero que quando essa cacetada que a vida ta dando passar, a gente esteja mais forte, mais disponível, mais atento e com mais coragem de estar. No fim do dia eu e a Thais não temos nada de especial pra que tivéssemos sido 'poupadas' desse transtorno nesse momento. Já esse transtorno, NESSE MOMENTO, olha... certamente ele tem muito ainda o que nos ensinar e fortalecer. Então... de algum jeito torto, estranho, que eu até duvido quando escuto, a menina emburrada e a mulher frustrada dentro de mim se olham e também sentem algo como: 'que bom que foi com a gente'... Vai entender...
É tudo bagunçado assim mesmo... E ainda é o 1º dia oficial da minha 'quarentena' de sei lá quantos dias.
quinta-feira, 13 de junho de 2019
Quinta-feira qualquer
"Eu encontrei e quis duvidar
Tanto clichê, deve não ser
Você me falou pra eu não me preocupar
Ter fé e ver coragem no amor..
E só de te ver, eu penso em trocar
A minha TV, num jeito de te levar
A qualquer lugar que você queira
E ir aonde o vento for
Que pra nós dois
Sair de casa já é se aventurar"
Hoje é dia de Santos Antônio. É feriado aqui no mundo mágico de Oz onde a gente nasceu. Você saiu pra trabalhar e eu fui mexer no nosso site de casamento, decidi dar play nas músicas que escolhemos pro site e me peguei às lágrimas pensando em você, na gente, na nossa história e na sorte que temos por nossos caminhos terem se esbarrado algumas vezes até que em uma delas decidimos prestar atenção nisso. Não sei direito a quem agradecer por isso. Se a esse santo casamenteiro que é celebrado no dia de hoje, se a Deus, à espiritualidade ou às nossas vidas passadas. Se agradeço aos seus pais, aos seus amigos e a todo mundo que tem alguma responsabilidade em quem você é. Sua janelinha do whatsapp ta aqui piscando e você ta contando que ta 'sentindo uma fome surreal'. Você é tão exagerada e entusiasmada com a vida. Eu quero TANTO agradecer por ter encontrado você, por ter te escolhido e ter sido escolhida de volta. Eu não sei a quem dizer esse Obrigada que enche meu coração de alegria e minha vida de sentido todos os dias nos últimos 6 anos e alguma coisa. Talvez eu devesse agradecer alguma força da natureza, sei lá. Mas se nós também somos a natureza e eu sinto tanta força em você, eu acho que tenho mesmo que agradecer a você, essa mulher incrível, essa força complexa, densa e leve ao mesmo tempo, que a natureza ventou na direção da minha vida. Ontem foi dia dos namorados e eu sentia tanta tranquilidade no meu coração por mesmo não achando que iríamos comemorar oficialmente, já que as coisas estão corridas, saber que nossas comemorações tantas vezes são cotidianas e com a nossa carinha, que aquela questão na verdade não importava. Ainda assim, meio que de repente, no fim do dia estávamos ali, cansadas de acordar cedo e trabalhar tanto pras coisas acontecerem, e juntas... Hoje tivemos mais uma daquelas conversas difíceis que a gente insiste em ter e você estava ali, mergulhada no nosso diálogo, mostrando o mais bonito e feio de você, despertando o mais bonito e feio de mim, você estava comigo imersa nessa relação banhada da crueldade amorosa que temos perseguido, por acreditarmos ser o mais potente e honesto. Você estava ali vivendo nossa rotina de conversas complicadas, nossa vida atravessada de sinceridade, forças, fraquezas, coragem, risco, dores, alegrias e os mais diversos sabores. Eu te amo tanto, baby. Tanto! Eu tenho tanto orgulho da nossa relação, da mulher que você se constrói diariamente e da mulher que eu consigo ser na vida potencializada pelo que você me impulsiona, me encoraja, me acredita e me instiga a ser. Tem tanto de você em mim que as vezes eu fico me questionando pra não entrar naquele estado de emaranhamento entre os sujeitos, que o Freud disse que acontece quando as pessoas estão apaixonadas, e que a gente sabe que não é de todo saudável, então eu fico aí toda emaranhada, mas toda desconfiada ao mesmo tempo. Você sabe né? Os preços de duas psicólogas se relacionando. É complexo. Tem tanto da gente na minha vida, tem tanto da nossa história nos meus planos de futuro e taaanto mais ainda dela nas minhas escolhas de presente. Eu tenho me emocionado tão gigantescamente nos últimos tempos com tudo isso de planejar casamento e de te escolher todos os dias, de novo, quase que em dobro do que eu já vinha fazendo desde que nos unimos. Eu te amo tanto, meu amor. Levou tanto tempo pra eu te encontrar (quem diria eu dizendo isso, hein?!) e ao mesmo tempo foi tão rápido te amar quando isso aconteceu. Nós nos encontramos, e temos nos encontrado todos os dias, temos vivido os bons e os maus encontros, os encontros mais intensos que eu poderia viver com alguém, ou com os cenários e as coisas todas que ficam tão coloridas e potencializadas de significado desde que eu conheci você. Obrigada por me escolher também, pelo seu olhar tão generoso comigo, pelo seu amor tão imenso, tão corajoso e tão cheio de força e fé. Obrigada por tanta fé nesse amor, por tanta fé em mim, por tanta coragem nesse amor. Eu espero que a gente siga se fortalecendo nessa união e que a gente siga conseguindo se reconhecer depois dos desencontros que, pelo jeito, são inevitáveis. Eu te amo demais, baby. Sei que já falei isso muitas vezes ao longo desse texto. É que com você eu aprendi que dizer do nosso amor não precisa ser uma coisa guardada pra deixar escapar só nos momentos finais e impactantes. Você me ensina a viver as éticas em que eu mais acredito, como essa coisa de apostar nos processos. Eu te amo em todo o processo de escrita desse texto, como tenho te amado em todo nosso processo de estar juntas e estar investidas em sermos quem queremos ser, de propósito, apesar de toda a dificuldade e conflito que pode emergir disso. Eu te amo tanto, baby, que to com a impressão de que acabei de te fazer uma carta de amor... Que seja! Mais uma vez, muito obrigada por tanta força, tanta fé e tanta coragem em me amar desse jeito único e gigante que faz eu me sentir mais forte e mais especial no mundo por ser amada desse jeito.
"You're my downfall, you're my muse, My worst distraction, my rhythm and blues I can't stop singin, it's ringing in my head for you My head's under water, but I'm breathing fine You're crazy, and I'm out of my mind (...) Cards on the table, we're both showing hearts Risking it all, though it's hard 'Cause all of me loves all of you"
Amor, feliz quinta-feira qualquer, que é cheia de significado porque é mais um dia em que estamos juntas e cheias de verdade no que une nós duas. E é cheia de gratidão, alegria e intensidade que eu afirmo pela enésima vez, que eu te amo ♥
quarta-feira, 17 de janeiro de 2018
O mundo que somos
O texto é grande, a imagem é essa mesmo, e sinto muito se o vocabulário incomodar. Lidemos com nossos incômodos.
O mês é dezembro, ano 2017, cidade de Registro, Vale do Ribeira, estado de São Paulo. O relógio ainda não marcava 18h. Horário de verão, céu extremamente claro e iluminado, ainda não sinalizava nada da noite. As pessoas estavam na rua, o calor convidava roupas curtas, pés sobre chinelos e alguma leveza e descontração.
Eu voltava do trabalho, vestia uniforme e caminhava de mãos dadas com a Thais, minha namorada e companheira.
Conversávamos sobre não faço mais ideia do quê, quando ouvimos uma voz rouca tentando dizer em som alto algumas coisas difíceis de entender (ou de aceitar) naquele momento. Olhamos pra trás e encontramos o dono da voz. Um senhor, idoso, andando com a ajuda de uma bengala e ainda assim com muita dificuldade. Homem, branco, passava dos 70 anos de idade. Julgamos que ele talvez estivesse chamando nossa atenção pra pedir ajuda pra caminhar. Fomos voltando um pouco na direção dele, que não estava muito longe, quando identificamos, afinal, o que ele tentava gritar na nossa direção.
- Putas! Duas putas. Porcas. Têm que morrer.
Demos a volta. Sequer nos olhamos uma pra outra direito. As mão inseguras seguiram segurando uma na outra, mas a caminhada se fez silenciosa, e os passos antes despreocupados e leves já se faziam incertos. Fizemos tentativas de retomar nosso assunto anterior. Já nem lembrávamos - e ainda não me lembro - sobre que trivialidades conversávamos antes. Continuávamos a ouvir:
- Duas putas. Porcas. Eu vou matar vocês.
Olhamos pra trás de novo. O senhor apoiou a maior parte do seu peso numa das pernas, segurou a bengala com as duas mãos e apontou para nós. Imitando alguém em posse de uma arma, o homem fingiu atirar na gente com sua arma-bengala. Ajeitou a mira e disparou, uma, duas, três, quatro vezes. "Têm que morrer", repetia o homem.
Eu tentava ignorar, tentei puxar a mão da Thais pra que continuássemos nosso caminho. Um homem que andava com tanta dificuldade desde o início da rua, se aguentou praticamente em apenas uma de suas pernas pra fingir que matava a mim e minha companheira. Thais olhou pra ele e fez um sinal de "xiu" com o dedo na frente dos lábios. Sinalizava que ele se calasse. Ele insistia:
- Eu vou matar vocês, suas putas. Eu vou rasgar vocês! Pegar uma faca e enfiar nessas buceta, e rasgar a buceta de vocês. Têm que morrer!! Eu vou matar vocês!!
Ele não ia parar. Ele não queria parar. Então até que a voz rouca desse homem se perdesse às nossas costas, continuamos andando, de mãos dadas. Mal conseguimos conversar muito sobre isso. Algumas palavras sobre como é triste e absurdo ainda passarmos por isso, e silêncios. Outros assuntos triviais tentando ser iniciados, mas já sem muito sucesso. Eu fiquei sem reação, incrédula, impotente. Minha companheira ficou com bastante raiva, sentia vontade de devolver todo aquele ódio. No entanto, seguimos de volta pra nossa casa. Cada uma afetada de alguma maneira, as duas arrasadas.
Não foi a primeira vez que sofremos algum tipo de assédio, julgamento, violência. Infelizmente, sei que por ora não será a ultima vez. Senti que não fiz nada do que poderia ter feito. A essa altura, honestamente, já nem sei o que eu poderia ter feito. Esse nem é o ponto aqui. No que diz respeito a esse ocorrido em específico, não tive condições pra nada além de silenciar ali e permanecer em silêncio, evitando retomar a cena mesmo em meus pensamentos, até agora.
Recentemente estive na exposição "Histórias da Sexualidade", no MASP, com a minha companheira. Íamos bem, conversando sobre o que víamos, felizes por vermos famílias com seus filhos e filhas, comentávamos as obras, fazíamos carinhos no rosto uma da outra. Em algum ponto, encontramos as obras de Moacir Soares de Farias. Vimos "Xoxotas (2003)" e seguimos para "Xoxota e faca (2005)" (vide imagem), diante da qual silenciamos, as duas. Equilibrei umas lágrimas que queriam cair e, com dificuldade, comentei com a Thais:
- Caralho, que merda!
Nós duas entendíamos do que se tratava. Ela me abraçou e respondeu:
- Sim, eu também lembrei disso. Na mesma hora.
As violências que sofremos nos afetam e nos invadem subjetivamente, no corpo, na memória. Comprometem nossa saúde, nosso bem-estar. Não existe segurança e pertencimento a um mundo que constantemente nos ameaça de morte, que nos mata e que nos mutila em ato, em discurso ou em fantasia, e que odeia pessoas a partir de seus modos de ser e estar, de expressar identidade, afetividade, sexualidade. Que nos odeia por existirmos. Só que essa merda toda cansa, pessoal. Nós existimos. Lidem com isso. E o façam com decência(de verdade, não aquela medida pelo tamanho da roupa ou por quem a gente beija na boca). Lidem com essas existências que incomodam. Façam algo com esses incômodos que nao seja na direção de mais violência, exclusão, sofrimento. Não da pra ficar sentado nos próprios privilégios se recusando a ver toda essa merda acontecer.
Eu pretendia guardar o relato desse dia de dezembro para conversas entre amigos, espaços seguros. Pretendia me calar, novamente. Silenciar, assim como fiz diante a obra de Moacir Soares de Faria que me remeteu a essa e outras violências já vividas. Por ser mulher, por me relacionar com uma mulher, por ser da periferia. Mas não é assim que vamos avançar enquanto sociedade. E uma hora chega. Cansa. Da vontade de mandar todo mundo à merda. Não da pra ficar segurando essas coisas dentro da gente. Vocês vão ter que nos ouvir. Enquanto vivermos em meio a tanta violência e ódio contra outros seres humanos, reparem. Escutem o que as pessoas, os movimentos sociais, as minorias estão dizendo. Prestem atenção. Pessoas negras, das periferias, prostitutas, mulheres, LGBTs: nós não temos garantidos os mesmos direitos que outras pessoas têm. Sequer caminhamos nas ruas sem estarmos submetidas a assédio, ofensas, violências, olhares de julgamento e condenação. Não vamos nos iludir, gente. Nós ainda não fazemos parte de uma sociedade formada majoritariamente por sujeitos que respeitam e promovem a diversidade. Nós ainda não vivemos em amor, infelizmente. Nós não vivemos no mundo que "gostaríamos de deixar para nossos filhos". Estamos longe dele. E na boa, não é um mundo melhor que temos que deixar para as pessoas. Nós somos esse mundo. Nos responsabilizemos por ele. Temos que ser e formar pessoas melhores para ocupar e deixar nesse mundo. Pra ontem. Pra já.
quinta-feira, 30 de novembro de 2017
Vivi uma longa cruzada contra meu próprio corpo.
Despejei sobre ele um monte de ódio, descrédito e maus tratos.
Considerei que ele não me servia.
Julguei feio, impróprio.
Escondi esse corpo do mundo.
Tornei meu corpo mudo.
Silenciando a expressão do meu corpo, me calei.
Esse corpo que sempre me honrou.
Me levou a lugares concreta e subjetivamente sensacionais.
Me proporcionou sentires e devires.
Me permitiu sorrir, gritar,
correr de um jeito engraçadinho,
andar com uma postura que é só dele,
chorar todas as dores que me afligiram,
tropeçar nos obstáculos do caminho,
girar, mudar e reinventar todos os percursos...
Esse corpo que me lançou no mundo
que sempre me brindou e tanto me serviu.
Esse corpo perfeito que eu julguei, condenei, odiei e mutilei.
Dentro e fora.
Ele me respondeu.
Me fez cair e uma parte dele se rompeu.
Me fez parar e olhar para o significado do caminhar.
Precisei pedir perdão,
a esse corpo, sim, mas também a mim
É hora de fazer as pazes com meu corpo e comigo
E tenho certeza que não será tão fácil assim.
Fazer as pazes
Com minha imagem e minha casa
Entender que meus passos são caminho, que meu corpo me dá asas
da maneira que ele existe,
Ele me escolheu.
Meu corpo é meu amigo.
Meu corpo sou eu.
quinta-feira, 23 de novembro de 2017
A qualquer momento a vida muda.
Olhando pra frente, parece perto demais
Olhando pro aqui, parece que ainda demora
Olhando pra trás, nem acredito em onde estou agora.
Tempo, espaço e suas relatividades.
Ontem, amanhã, hoje, e uma intrigante relação de amizade.
E aquela estranha sensação segue adiante
dizendo que a qualquer momento a vida muda
A vida - impaciente, faceira e falante -
Muda
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